terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Para 2010

Não é uma questão de atrair ou planejar. É só querer. Um querer desses que faz olhar para a frente, saltar os montes, atravessar correnteza. Enfim, desses quereres que não conhecem não. Duas opções para essa insistência veemente: alcançar ou amargar uma frustração difícil de se desfazer. Na primeira opção, o querer há de, inevitável e infelizmente, envelhecer, perder o gosto, a elasticidade e virar memória (boa, mas só memória). Na segunda opção, vira poesia. E a poesia, meu amor, ah a poesia... É a esperança mesmo que não haja mais nada, lembrar constante do que poderia ter sido e não foi, não será - não aqui, talvez nem nesse lugar. A poesia é o fim alternativo eterno. Não é um deleite despreocupado do desejo. É crueza que passa pelo filtro inconstante e imperfeito que eu sou. Ah, a poesia, meu amor...
É o que eu desejo em 2010: quereres que não aceitam não. Assim serei feliz serena. Ou poeta.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Da utilidade

Então nos tragou essa necessidade de ser útil. Como máquinas com manual de instrução ou animais treinados para rodar a moenda e carregar fardos até a exaustão. Quando não encontramos funcionalidade naquilo tudo que vivíamos parece que acabaram-se as pilhas. Tentamos, em vão, trocar. A fraqueza abateu tudo e não houve alcalina que resolvesse o nosso impasse.

Não havia também assistência técnica especializada na lista telefônica. Procurei do meu jeito, você do seu. Não houve. Um não constante diante de um beco completamente fechado. O escuro e tudo o que dele viesse a ser. O escuro não é assim esse vilão. Foi apenas o reflexo de um estado em que chegamos juntos. Apagamos uma a uma as luzes que nos carregaram até aqui.

No princípio era o próprio Luzeiro Maior. E quando faltava essa luminescência, outros menores enfeitavam o que para nós era gala, festa e transbordar constantes de líquidos aconchegantes que dividíamos, multiplicávamos. Éramos, apesar de. Éramos.

Eu me levantava e fazia o café com o cheiro forte que te despertava de sonhos em que eu mesma te colocava. A mim me agradava o café mais fraco, mas o fazia negro e espesso para saciar o paladar que você deixava em minha boca. Era sua a minha utilidade.

- Me faz um café...

- Hãn? - Despertei com a tua voz pouco desperta.

O seu pedido naquela manhã, todas as manhãs depois que não precisou pedir qualquer coisa que fosse deveria ter me servido de alerta. Uma das luzes extinguiu-se. Sem aviso, talvez de maneira tão imperceptível.

Com a mesma devoção de meses, pus-me de pé. Mais uma vez, coloquei três colheres bem servidas de pó no filtro e esperei pacientemente que a água fervesse na leiteira, depositada com cuidado na maior das bocas do fogão elétrico. A energia que fizera o fogo. A utilidade de um simples botão. Basta um toque e fez-se o fogo. O fiat que não mais se pronuncia, se aperta.

Café era a única coisa que eu tinha a capacidade de tirar da matéria-prima na cozinha. E a sua utilidade, antes mesmo de corrigir os meus textos em inglês ou arrumar os meus livros desajustados na estante, era me manter longe das dietas compostas por instantâneos. Talvez, se eu tivesse te permitido ser mais útil. Se eu não tivesse arrumado o chuveiro quando a resistência parou de resistir. Se eu não tivesse matado as baratas que percebiam sua ausência para fazer delas o meu apartamento. E se eu tivesse te ligado aos prantos quando a água insistiu em invadir minha casa. Mas não. Não te deixei ter a utilidade do macho que protege a indefesa fêmea da caverna.
Saí da caverna e te deixei sozinho nela. A culpa não é minha. Muito menos sua. Nos amamos, nos utilizamos. Fomos úteis. Mas de alguma forma as coisas pararam aos poucos pelo caminho.

No copo, daqueles que vinham com requeijão dentro, pairava um café bege. Fraco como graveto comido por dentro. E você sorriu quando apareci pelo vão da porta da cozinha, com ar ainda sonolento.

- Acho que você perdeu a hora, meu bem. - E me entregou o café ao meu gosto. Doce e ralo, do jeito que você sempre se recusou a tomar. Um gesto desesperado de se desprender do próprio sabor para abrigar a minha coisa. O que eu fiz, incansavelmente, mas sem qualquer cobrança durante o tempo que permanecemos iluminados. Não te pedi pagamento por ser útil ao seu paladar, esse era a minha contribuição, como um adicional de fábrica..

Perdi a hora, me perdi no tempo e deixei que se apagassem mais algum daqueles luzeiros que nos guiavam. O atraso em que me envolvi, o caminho equivocado pelo qual me embrenhei impediram que eu desse atenção para os pequenos apagões que se fizeram no cotidiano da casa que partilhavamos. Sob o teto que chamamos nosso, instalou-se uma espécie de racionamento não determinado por lei, mas pela prudência desavisada que nasce com o ser humano e estoura em períodos de alerta.

Talvez foi culpa desse racionamento eu não ter percebido de imediato quando os seus livros de filosofia pura partiram da confusão da poesia esparramada pelos volumes na estante.

- Onde estão os seus livros? - me dei conta, uma semana depois de diversos vazios terem se instalado na estante.

- Precisei levá-los para a faculdade – você disse.

Deixar no abandono a minha poesia era mais uma lâmpada que apagamos, uma que estava em posição estratégica. Apagá-la foi fulminar uma cadeia inteira delas. Solitários, aqueles versos todos me desencaminham, rompem um lacre, tornam infinitos horizontes outrora próximos e reais, que moravam dentro das possibilidades. Você sabia disso.

- Intercalei Vinícius com Descartes. Assim, eles se ajudam e constroem um amor menos doloroso e triste, mais lógico. - E eu ria quando você me explicava porque deixou a Clarice ao lado de Nietszche ou Hegel perto da Lygia Fagundes Telles. Assim, um por um, você os tinha mudado para a minha estante, tempos antes de retirá-los sem aviso prévio.

Quando percebi a ausência dos seus clássicos, meus olhos encheram-se de lágrimas. Nós sabíamos, sem palavras, o significado daquele abandono literário. E você me abraçou com seus braços de paz, beijou-me da maneira terna e pacificadora. E, pela última vez me amou com um amor de amante antigo, sossegado. Na manhã seguinte, levantei-me e passei o derradeiro café preto. Negro, sem piscas, sem luzes, sem reflexos.

Interessante é que não resisti. Não à maneira de fera ferida, de animal que se debate quando abatido. Apenas conversamos, procuramos uma solução que nos tornasse novamente úteis um ao outro. Não havia. Você me ensinara o que eu precisava saber do que, à sua maneira, era viver, organizara minhas roupas, meus livros e pensamentos. Eu te desarrumei o que precisava de desordem e tirei amarras que você julgava arrimos. Fomos úteis um ao outro. Já não havia mais funcionalidade para nós.

Antes mesmo que eu notasse os armários vazios de você, em mim já não havia nem mesmo uma gravata abandonada em algum canto qualquer. As suas malas estavam postas ao lado da porta da cozinha e o cheiro de café, preto e forte, feito por você era predominante no ambiente. Não dissemos nada. Você apenas beijou carinhosamente a minha mão direita, essa que eu uso para escrever, para alisar os cabelos ou coçar os olhos da maneira infantil, como você gostava de ver. Se divertia com esse gesto primitivo. Eu, resignada, deixei que você partisse, devolvendo um beijo no seu rosto com a barba sempre impecável. Marca da sua civilidade e asseio.
Agora, perdido e sem rumo, entre Hilda Hilst e Drummond, está o volume do “Crítica da Razão Pura”. Kant ficou esquecido na estante. Para mim, já sem nenhuma utilidade.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Anúncio

Conjunto de histórias boas e ruins. Esses cheiros todos que rodeiam a vida, cores estranhas que tornam-se familiares e sensações que se perdem. Antes tão vivas, agora resquícios na lembrança. O Natal traz de novo e de novo o que os dezembros me levaram e anuncia um incansável recomeçar de janeiro. Se pudesse, estenderia os dezembros, eliminaria os janeiros. Não porque não gosto de começos, mas prefiro o anúncio. Paro nos anúncios, brinco com eles, dou a eles as cores que me agradam, os toque tão meus. E quando o anunciado vira início, é algo de se lambuzar, mas fica embaixo do tapete o anúncio que me fiz, a previsão que não tomou o corpo que minha fantasia quis. Amo dezembro desde o início. Acho que escolhi dezembro. Podia ter sido fim de novembro, mas novembro tem sempre um gosto amargo de fim. Não aquele fim tranquilo de conclusão competente. É o fim cinza, anunciado também, anúncio para o qual finjo uma surdez de nascença.
As luzes que apontam a Luz maior, que escolheu o escondido para se fazer grande, não iluminam, mas tornam o caminho mais belo, mais encantado. E a beleza está no quão passageira elas são. Não duram um mês, não duram nada. Como uma felicidade que nasceu condenada a se apagar quando passar dezembro. Dezembro é esse mês iluminado que antecipa o início e torna o fim um pouco menos morte, menos fim. Apenas o anúncio, uma pausa no meio do turbilhão que afoga. É uma pausa para que se retome a melodia que ludibria, porém, garante a insistência, a busca contínua e incansável de ser.
Não desejo que o natal seja feliz. Desejo que seja total. Não quero que o ano novo seja feliz, anseio que seja completo...

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Não acordei

O sono é uma espécie de aliado de um universo interior. Quando acordo sem acordar direito fico o restante do dia entre um mundo onírico e o real. A sensação é de que oscilo entre o mais absoluto concreto de ser aqui e agora, e a bruma, a sombra de nunca ser em lugar nenhum.
Hoje, abri os olhos custosamente. Pedi ao relógio alguns dez ou vinte minutos a mais. Clemente e disciplinado me deu o que eu pedi, nada mais, nada menos. Então saí da cama, mas não acordei. Descerrei as pálpebras, mas não veio comigo aquela coisa interior que teria de andar colada a esse corpo completamente real. Tão real que chega a cansar. Objetivo como um lide. Quem, quando, como, onde e por que? Todas essas respostas à flor da pele, nada além dela.
Não é sonambulismo, que sonâmbulo não vê. É um misto de saber, mas não reconhecer. As emoções, então, têm certeza de que podem atravessar os limites que a coesão lhes impõe. Pq a coesão não acordou. Está entre o edredom e o travesseiro.
As respostas prontas e impensadas são apenas um reflexo da confusão que o que está solto por dentro deixa escapar para disfarçar. É como uma identidade secreta ao contrário. Ou uma ocupação. Um corpo estranho que mora em mim antes mesmo de mim.
Então, enquanto essa flutuância some em algum lugar que desconheço - mas que é meu, sou eu -, olho o que é concreto e invejo. Queria isso tudo. Esses brilhos, essa constância, esses sorrisos e festas. Queria o salto alto, o vestido longo. Queria esse conjunto, a grama alheia. Meu ouro se ofusca e parece latão, pq na realidade não está ao alcance. Quando não acordo nada em mim é tangível, nada em mim é real. Sendo completamente concreto. E é esse concreto que me faz querer cerrar esses olhos que enganam ver. Só enganam. Estão fechados, escuros, com sono.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Ter sido

Tão cansada hoje... Sempre que me vem esse cansaço, me lembro da Clarice: não estou triste, estou cansada. Não é aquele cansaço de dormir e melhorar. É uma estafa de tudo, inclusive de mim. Coisa de gente grande que eu não queria ter. Ontem, vi o Dines falando de jornalismo e tive saudades de quem não fui. De tantas Arianas que não foram. E me lembrei de um poema lindo do Vinicius, chamado O Haver. Sim, há o haver. É essa poesia não vivida. O que fazer dela?
Acho que deve ser mais ou menos assim que estou (ah, chorável se ouvir aqui enquanto ler):

Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo:
— Perdoai! — eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer balbuciar o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia de simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano, ou essa súbita alegria
Ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória...

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera cega em face da injustiça e do mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de sua inútil poesia e sua força inútil.

Resta esse sentimento da infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa tola capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem de comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo esse desejo de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não têm ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
E transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta essa obstinação em não fugir do labirinto
Na busca desesperada de alguma porta quem sabe inexistente
E essa coragem indizível diante do Grande Medo
E ao mesmo tempo esse terrível medo de renascer dentro da treva.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem história
Resta essa pobreza intrínseca, esse orgulho, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do próprio reino.

Resta essa fidelidade à mulher e ao seu tormento
Esse abandono sem remissão à sua voragem insaciável
Resta esse eterno morrer na cruz de seus braços
E esse eterno ressuscitar para ser recrucificado.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, esse fascínio
Pelo momento a vir, quando, emocionada
Ela virá me abrir a porta como uma velha amante
Sem saber que é a minha mais nova namorada.

Vinicius de Moraes

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Círculo ferrífero

O ferro com gosto de sangue
Um pouco do que está agora
Que deixa de pulsar
Que para de correr
Que deixa esse gosto azedo
Mas não deixa de ser vida

É a ferida aberta e não vista
Dia após dia, como água em pedra
Bate em mim esse líquido
Essa viscosidade toda
Essa umidescência oculta
Amolece, cansa, impulsa

O gosto de ferro insiste
Como esfera explode inerte
Língua, dentes e mãos
Não há nada que possa ser feito
Nada que se evite
Acontece imprevisível

Corre nas veias o ferro
Corre no ferro essa vida
Fria, dura, escura
Se aquece no fogo da alma
Escorre vermelho disforme
Não deixa de ser ferro

Não deixa de ser vida

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Granulado

A campainha do celular chama insistente, enquanto o relógio marca 7h30 da manhã. Por um instante não me lembrei que a data merecia ligações, felicitações e outras demonstrações. O que significa comemorar mais um ano, afinal? Quando criança, essa data era verdadeiramente uma festa. Começava na noite anterior quando na cozinha enrolávamos os docinhos para o dia seguinte. Na tarde do grande dia era a vez das bexigas, enquanto os homens cuidavam de estender a lona sobre o quintal, uma forma de proteger os convidados em caso de chuva. Mão providenciava roupa nova para a ocasião e colocava uma colcha bem bonita na cama, que acolheria cuidadosamente os presentes (de preferência brinquedos porque roupa não é presente que se dê pra criança).
E vinha a festa, os amigos, os adultos, as músicas, brigadeiros roubados das franjas do bolo que, vez ou outra, tinha meu nome escrito em doce colorido.
Alguns anos depois, a festa com baile no fundo do quintal, a música lenta que embalava os primeiros casais aos pés da jabuticabeira. Frutos negros e brilhantes como aqueles olhos que ainda não viram tudo. Salgados e nada de adultos com docinhos.
Depois as festas na faculdade, antecipados os presentes, comemoração de férias, de fim de semestre de notas. Um misto de presente e despedida.
E agora. Não faz muito tempo que tudo isso passou. Ou faz tempo demais e não me dei conta de que é tudo passado ou uma história que já foi contada. Por que aniversário, afinal?
As vozes revezam-se no ouvido. Chegam de espaços distantes. Não poderão comer cajuzinho em volta do bolo com bolinhas. Mas lambuzam-se de brigadeiro em espaço que é deles, em algum canto de mim. Há os que mantiveram silêncio por um ano. Há os que falam todas as semanas, todos os dias. É dia de chocolate. E o sabor de cada um deles se instala em cada poro, em cada canto. O aniversário é deles. E eles o melhor presente que poderia ganhar. Os ganho todos os dias, hoje eles só mandam entregar.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Tolerância

Estou escrevendo uma matéria sobre tolerância. E me lembrei de uma música de infância: é tão lindo, não precisa mudar, é tão lindo, deixa assim como está, e eu adoro, é claro, difícil é a gente explicar essa amizade entre nós... Com Simoni e Roberto Carlos. Tinha abolido um pouco o tom confessional aqui, mas acho que vale: as pessoas estão cada vez menos tolerantes. Assustador.
Eu já fui completamente intolerante com o que não era eu. O tombo que levei há alguns anos me fez rever tantas coisas. E, às vezes, me sinto tolerante demais com as situações, com as pessoas, com tudo e isso dá medo.
Mas voltando ao fato da intolerância. Na sexta-feira, fui ao cinema. Sala VIP só gente que se pode considerar de um nível social mais elevado (eu pago meia e quis fazer esse agrado pra minha irmã que estava por aqui). Cinco minutos de filme e senti uma pancada forte na minha poltrona, virei pra trás e um homem, de uns 45 anos, mais ou menos, estava agredindo um adolescente de 15 anos, que tinha sido indelicado com a mulher dele. Esbravejou, gritou, arrastou o menino até a porta do cinema. Todo mundo parado, sem saber o que fazer diante daquela situação. Quando um moço tentou segurar o cara, levou pancada tb. E a namorada do moço tentou separar a briga, quase apanhou, coitada. Eu fiquei esperando subirem a vinheta do Festival Internacional de Teatro. Não era possível que estávamos todos presenciando aquele tipo de cena em um cinema. Fato é que algumas pessoas mais se rebelaram pq não queriam continuar na sala de cinema com aquela situação. Enfim, foi um barraco dos mais barraquentos que já vi na vida.
É inacreditável como qualquer minúscula coisa é capaz de gerar uma guerra. É impressionante como as pessoas sustentam uma pose de que são modernas e que são capazes de acolher todas as idiossincrasias mas na hora do vamos ver é tudo fachada. É assustador. Acho que entendo um pouco do que aconteceu na Uniban com a moça Geyse. Não importa o que ela é, que tipo de roupa usa, o que fez ou deixou de fazer. Não é ela que está em questão. É a reação das pessoas frente ao que não é elas. Eu penso que as pessoas se dão muita importância. E acreditam mesmo que tem o melhor jeito de vida. E que todos deviam ser iguais.
Até o nome de Deus as pessoas têm a petulância de usar para condenar comportamentos e posturas. Só me lembro que o próprio Deus fez: tinha lá uma prostituta que por lei deveria ser apedrejada. O Deus desafiou: quem nunca pecou, atire a primeira pedra. E fez mais, almoçou com políticos ladrões, com mulheres de índole duvidosa e confraternizou com pessoas “impuras”. E eu gosto desse Homem, tenho tanto a aprender com Ele!
O que não era igual amou os que não eram iguais. A gente ainda tem o que aprender. E pode ser que a gente aprenda. Essa é minha esperança! Até lá, meninas, cuidado com os vestidos curtos demais. Pessoas, não exibam comportamento diferente do que se espera nos cinemas, nas festas, nas ruas. Moços e moças, fica um conselho do Ivan Lins, cantado pela Elis: nos dias de hj, não lhes dê motivo, porque na verdade eu te quero vivo...

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

quase 30

Concebida em noites de carnaval
No berço entre montanhas e cachoeiras
Nasci em dezembro nostálgico
Agora, sou conflito
Entre a escola de samba que passa
E a saudade de tambores permanente

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

De choque

É engraçado. Há mais de um mês comecei a fazer terapia. Afinal de contas, um monte de gente faz, minhas amigas que começaram super se sentem bem, até minha irmã faz faculdade de psicologia. Eu acho válido despejar os males da cabeça em uma sala.
Então tá. Eu vou lá uma vez por semana, um senhor distinto, calmo, eu diria pacato até, me recebe educadamente e me convida a sentar em uma poltrona. Depois de pegar minha carteirinha do plano de saúde e colocar minhas digitais no programinha do computador, me sento e espero ele terminar umas anotações. E então, ele diz. Eu sorrio sem graça e digo, e então. E falo, como se fosse: meu querido diário, essa semana fui ver os meus pais. Foi legal, estava com saudades, comi pão de queijo e dormi até tarde.
Acho que não peguei o espírito da coisa. Talvez meus males interiores não tenham remédio. Cura eu sei que não têm. Não carrego essa ilusão de me ver livre deles. Pelo contrário, são como uma doença maligna (?) que avançam e um dia vão me consumir. Mas tinha de ter remédio. Tipo alguma coisa que me anestesiasse, que me distraísse, pra que eu não me desse conta de que eles avançaram mais uma linha de neurônios em menos de um mês.
E então, eu conversei com a minha irmã a conversa que taí embaixo conversada:

Ariana diz:
ai, fer, acho que não to gostando da terapia
Fernanda diz:
pq Ari?!?!
Ariana diz:
ah, não vejo utilidade em ficar falando de mim pra um desconhecido
Fernanda diz:
cabeção, vc não ta falando de vc pra um desconhecido ... ta tentando organizar sua aflições com a ajuda de um especialista nisso
Ariana diz:
ah, eu queria que ele fizesse um relatório no fim de cada sessão. Igual receita médica, pra eu saber, uai
Fernanda diz:
mas ele não é medico, ari .. quer dizer esse é .. mas ele não tem essa função na terapia
o q vc tem q aproveitar dele é o q acontece durante a terapia e não o resultado dela no fim da sessão
Ariana diz:
acontece que eu fico falando
ele escuta
pergunta
e ri
eu rio
falo
e acaba
eu penso as coisas que digo pra ele com ou sem terapia
Fernanda diz:
tenta falar isso pra ele .. isso q vc ta me falando .. acho q ele vai poder te esclarecer melhor

Ariana diz:
esclarecer o que?
Fernanda diz:
o pq de ser assim .. vc fala ele pergunta vcs riem .. esclarecer se não tem outra jeito de fazer ..
é q cada terapia é diferente da outra
Ariana diz:
eu disse pra ele que acho meio nada a ver eu ir lá e ficar falando
ele disse que terapia serve pra isso, pra falar
então eu falo com o meu espelho, uai
Fernanda diz:
ah Ari eu não acho a mesma coisa.. mas vc não ta pagando nada .. qual o problema de ir lá e fazer umas reflexões de vez em quando!?

Ariana diz:
o problema é esse, fer
eu faço reflexões o tempo inteiro
tem uma terapia de não fazer reflexões?
Fernanda diz:
sim
de choque!

E agora eu me pergunto: 110kw ou 220kw?

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Companhia


Cansou de tanto ver e sentou-se em um galho baixo. Analisou os entornos, olhou com o olho da direita, viu com o da esquerda. Percebeu minha presença a menos de três metros dele. Entortou a cabeça branca, preta, branca, cocuruto preto. Limpou cada uma das pequenas penas amarelas do peito. Me olhou com os dois olhos mais uma vez, passou para as penas maiores. Coçou com a patinha de forca a cabeça desconfiada. Penas das asas. Dentro e fora, da raiz às pontas. Ouviu os amigos que viam. Emudeceu. Cansado de tanto ver. Amuou-se com suas penas no galho. Acostumou-se com a minha presença. Cochilou. Uma confiança que os bichos, todos gordos, tanajurados, estavam aí disponíveis. Que as companheiras estavam a bater as asas por aí e que há árvores e postes aos montes para que se façam ninhos. As peninhas arrepiadas, o corpinho encolhido. Não fosse a faixa negra na altura dos olhos, eu teria certeza absoluta que dorme. “Olhai e vede as aves nos galhos”. Quietinho. Cansou de tanto ver? Alguém grita lá longe. Ele cresce. Estufa o peito, bate as asas no lugar e mostra a potência criadora de que é feito – bem-te-vi – e voa. Às vezes, é preciso amuar-se com as penas nos galhos para que a potência criadora devolva o poder de ver, a intensidade do canto. E as asas.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Citações

Não sou daqui
não sou de lugar nenhum e isso é um abandono
Uma derrelição, como diz a Mula
Faltar esse fio causa uma sensação
de precipício na boca da existência
Vocação, diz outra
Do latim: vo-ca-re, frisa a deusa
Ecoa, insiste, puxa como imã
Sem se deixar ver, tampouco saber
De que lado e pra que lado força
Saber muda alguma coisa?
Saber, saber mesmo, alguém sabe?
Ainda que descubra aqui e ali pequenas migalhas
Nunca completa, nunca enche, nunca
Cessada busca, finda a vida

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Visita

É difícil a gente reconhecer algumas coisas quando elas são invisíveis a esses olhos que enxergam por fora. Escrevo constantemente (é meu ofício) sobre felicidade. Os profissionais dão dicas, identificam-se as causas, fala-se da importância de ser feliz, como a felicidade está nas pequenas coisas. Não há espaço para a Irmã Tristeza (permita-me, minha cara, chamá-la assim, como São Francisco faria) na sociedade na qual estou, para qual acordo todos os dias, com a qual tenho de lidar dia após dia.
Hj, uma amiga me perguntou pq ando quieta, sumida. Eu respondi, simplesmente: “estou triste”. Só isso. E, quando li minha resposta, tive pena de mim. Como se estar triste fosse pior do que passar fome, pior do que ser viciada em substâncias químicas, pior do que ser desprezada, esquecida, marginalizada, não ter onde dormir. Como se eu fosse uma completa herege.
Irmã Tristeza está tão hostilizada atualmente. Não tem lugar pra ela. Fiquei pensando nisso. Há meses, resisto firmemente em escrever ou dizer essa simples frase: “estou triste”. E só quando assumi percebi que isso é completamente libertador.
Por favor, não me consolem. Não digam que vai passar. Muito menos, que eu não tenho motivos para estar triste, que tenho tudo, que trabalho, que tenho saúde. Eu sei disso tudo e deve ser por isso que resisto tanto em dizer: “Irmã Tristeza, pode entrar. Se aconchegue, estou preparando um lugar decente para que descanse já que faz tempo que não é bem recebida por aqui. Quer um chá? Não quer tirar os sapatos? Fique o quanto quiser, desde que me deixe respirar por alguns períodos, pois sou feita de vc, mas a Irmã Alegria também precisa chegar de vez em quando.”
Por favor, me deem licença para estar triste. Mas não me abandonem na minha tristeza. Permaneçam por perto quando eu precisar de um silêncio familiar ou apenas de um olhar que me garanta que a Irmã Tristeza não gosta de morar pra sempre em uma mesma casa. Pra que eu tenha com quem sorrir ou gargalhar, mesmo que a Irmã Tristeza se ressinta um pouco com esses gestos tão cotidianos.
E ela está deitada no sofá. Quer dormir, exausta. Mas eu a incomodei tanto que não conseguiu pregar os olhos. Primeiro eu tentei bater a porta na cara dela. Quando ela pulou a janela e conseguiu entrar, tentei impedi-la de se estabelecer. Falei, sorri forçado, sai de casa e fiz barulho pra ver se ela desistia de se sentar. Não adiantou. Aí, comecei a pedir que outras pessoas a incomodassem por mim, que dissessem a ela que não era bom que ficasse: desfilaram pela sala um psiquiatra e psicanalista, vários amigos, freiras, padres, poetas, escritores... Não adiantou. Aliás, os escritores e poetas ficaram amigos dela e engataram um assunto sem fim, ainda estavam até agora pouco trocando causos entre si.
Então, hj, quando eu disse: “estou triste”, foi como se eu dissesse “tudo bem, Irmã Tristeza, estou tão exausta quanto vc. Deixo que vc descanse pq eu também preciso de descanso”.
Ela está cochilando. Acho que vai ficar um tempo por aqui ainda. Estou procurando um ventilador pra garantir a ela um sono mais tranqüilo. Os poetas e escritores estão um pouco chateados pq o sono da danada interrompeu um papo bom. Agora, eles conversam comigo.

sábado, 7 de novembro de 2009

É tudo uma brincadeira

Saí às pressas do jornal para chegar a tempo de conseguir um bom lugar para degustar o show do Toquinho, que inaugurou o Teatro do Sesi, em Rio Preto. Duas crianças brincavam enquanto esperavam que a mãe encerrasse o expediente e fossem juntos para casa.
"Tá frio"- e o menino se movia.
"Tá esquentando"- e o menino se esmerava mais.
"Tá quente"- E continuaram até que eu não mais ouvisse esse jogo de encontrar e perder.
A vida tinha de ter uma voz dessa para cada ser humano. Quando eu me aproximasse do que vale a pena, escutaria: "tá esquentando". Quando me afastasse de uma oportunidade realmente indispensável, imediatamente, ouviria voz glacial: “ta frio”.
Seria um termômetro do bem viver. Não teria erro. Nem esse jogo cansativo de tentativa e acerto. Se a vida fosse uma brincadeira de criança, eu ficaria feliz quando me “queimasse” encontrando, finalmente, um graveto, uma moeda ou seja lá o que fosse que o outro tivesse escondido de mim.
Mas não é assim. Não tenho voz (pelo menos não audível com ouvidos naturais) que me orienta, não tenho dicas de onde procurar ou quando estou mais perto ou mais longe, não sei, muito menos, o que esconderam de mim e eu fico inutilmente me desgastando para encontrar. Com a mesma avidez daquele menino na porta do jornal.
Aqui dentro, no entanto, não deixa de esquentar ou esfriar. As vozes não dizem com clareza quando estou próxima ou distante de encontrar o que quero, o que busco, mas se disfarçam em textos, músicas, olhares e gestos. Eu me esmero como o menino.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Seiva

Se esconde nas dobras
De uns estalactites que se fizeram
Por anos, meses, minutos
Mas escorre devagar

Ocupa, não silencioso
Com um barulho tímido
Devagar, quase imperceptível
Cada canto, canta cantar, o canto

Há quem veja pedras
Terra, lodo e húmus
Não se enxerga a vida
No meio do escuro e úmido

Ele está lá, forte
Vivo como tem de ser
Germina sem som, pulula lívido
Não precisa de aprovação
Nem de existir

Para estar lá
Aqui
Dentro
Onipresente

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Planos de eternidade

Li que a perspectiva de uma eternidade é o que faz o ser humano capaz de superar, de projetar-se e crescer. São os planos para amanhã, para o ano que vem ou para daqui alguns anos que dão força quando o agora não consegue saciar. Isso é salvação ou a mais pura armadilha. Salvação quando olho o presente e não consigo vislumbrar a realização que gostaria agora, então, projeto, penso em como fazer, traço meus planos. E isso me faz sentir a Vida. Armadilha pq posso simplesmente abstrair do agora e viver no encantado mundo das minhas fantasias. Sabe, um desabafo, eu não costumava ser tão sensível. Não sei em que momento esse alien se formou aqui dentro e me faz aumentar as coisas, colocar lentes que me ferem por qualquer pedrinha, em que ponto resolvi ser “fingidor”. Mas esse mesmo alien potencializa a alegria cotidiana. Me faz rir da vida. Garante leveza no insustentável. Dura um segundo que pode ser eterno. É o segundo que me projeta, me salva e redime. Ou simplesmente me perde para sempre.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Dos pronomes possessivos

Cansada das pessoas. Isso porque devo encontrar nelas o que me limita em mim. Não aguento mais a vaidade, nem a carência, muito menos a falação e as picuinhas próprias de quem respira. Ninguém está realmente preocupado com o que o outro fala. Ninguém está realmente disposto a ouvir. Não sou capaz de ouvir além da China, Mateus. Quando chegamos lá, já cansou o roteiro. O que importa de verdade se você vai até a China ou ao consultório do outro lado da rua com problemas que só dizem respeito a vc mesmo? Se, dentro do meu roteiro coubesse alguém além de mim e do saco de vaidades que carrego sobre os ombros (acabei de tomar um dorflex, quem sabe alivia um pouco), talvez meu itinerário interessasse a mais alguém. Mas não interessa. Estou preocupada demais com o que escrevo, com o que deixo de escrever com o que escreverei. Sou eu o que me preocupa, são as minhas dores, as coisas que em mim são incompreendidas. Preciso das luzes, os holofotes têm de estar sobre mim. Admito dividir o palco com mais uma ou duas pessoas, desde que venham ser escadas para que eu tenha ainda mais destaque, desde que acrescentem algo. Não ao roteiro, mas a mim, à minha história, às minhas dores, às minhas conquistas. Dia desses ouvi que algumas tribos não conheciam o pronome MEU. Nunca gostei de estudar os pronomes POSSESSIVOS. Sempre os achei ofensivos demais. E é só o que são: MEU, MINHA, TEU TUA, SEU, SUA, NOSSOS, NOSSAS, VOSSOS, VOSSAS... Não existe sentido nisso tudo. Preciso de férias em alguma astronave por ai. Como diz uma música da Ceu: voltar pra nave mãe, pra despressurizar. Não cabe mais nada na frase com pronomes possessivos. Não cabe mais nada dentro de um ser que encarnou cada um deles. Fico assim, vazia, escura, sem vida, sem verbos, adjetivos ou adjuntos. É tudo só posse.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

É por isso?

Nunca soube ao certo pq escolhi jornalismo. Uma série de opiniões e acontecimentos me levou à faculdade de comunicação social. Com o tempo, peguei gosto pela coisa e me apaixonei perdidamente. Claro, os tempos são maus e a gente perde isso pelo caminho. Mas sábado foi diferente.
Me sentei na cadeira pra enfrentar o que detesto: pelo menos meia hora de um trem quente que esquenta os cabelos pra discipliná-los, escova (acompanhada de chapinha, of course!). E ela começou:
- Pra quê é a escova?
- Casamento - (que fique claro, DETESTO salão de beleza!). - Todo mundo casando, moça. – Forjei uma simpatia que sempre me falta nessas situações.
- Ah, me casei tarde. Já tinha 38 anos. Praquela época... Mas até casar dei tudo o que podia e não podia. – Riu alto e convidativamente.
E teceu histórias, comentou a vida, política, jornalismo. Desfiou ali, enquanto fazia a festa do estica e puxa nas minhas madeixas, tanto causo e tanto ensinamento que passei fácil pela tortura da chapinha. Enquanto ela falava, eu pensava instintivamente como contar aquelas histórias todas. Nessas horas, entendo a minha escolha. Contar o que é contado é uma das coisas mais incríveis que conheço.

p.s.: não vou conseguir escrever o que ela disse. Foi tão espontâneo. Quem sabe, com mais calma, um dia, quando tudo já estiver mais fermentado com o tempo...

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Confesso

A verdade é que eu dependo de vc. Mesmo quando emburro com as minhas pirraças de menina, basta que você me olhe para que as coisas todas, mesmo sem sentido, percam a força de me incomodar. Não é anestésico. Às vezes, só às vezes, me dá a impressão de que vc é meio sádico. Que gosta quando eu chorosa, sem ter para onde correr, me despenco sem saída, ao seu lado. A saída seria simplesmente ignorá-lo. Eu consigo fazer isso. Mas, uma hora ou outra, a sua lembrança me invade assim avassaladora, me deixando sem escolhas, como um raio paralisante. Não sara a dor. Não arranca as feridas. Não tira o jugo (que agora pesa como uma bigorna). Mas, talvez, me faça outra. Me faça uma espécie de Hulk cor-de-rosa (ainda tem hífen isso??) que carrega os pesos com a graça e a leveza de uma bailarina. Nós dois sabemos que de Hulk eu não tenho nada, ainda que as máquinas fotográficas fajutas tenham a certeza disso e tentem me fazer mais gorda, mais torta, mais sabotável. Como se eu mesma não me sabotasse o suficiente. Também não tenho nada de bailarina. Não sei dançar e finjo saber lutar. Não quero dizer que te amo, mesmo que tudo diga o contrário. Ainda estou emburrada, a chuva repentina deixou estragos por aqui. Pode ver na televisão, saiu até no Fantástico. Não me afoguei, ninguém me salvou também. Não sei nadar, mas as enchentes constantes me fizeram desenvolver minhas próprias estratégias, sem ter de depender de vc. Não pq vc não me salvaria se eu gritasse. Só estou afônica, não quero mais gritar. O sol já está de volta, um pouco tímido. Logo me distraio com ele, te abraço como se nada tivesse acontecido e sigo a sina que me cabe, um pouco sem escolha. Não estou brava com vc. Não deixei de te amar nenhum milímetro (ainda que pense que deveria muito fazer isso). O seu olhar e coração garantem que tudo seja eterno, mesmo que o aqui diga que acabou. O aqui não fica. O aqui já passou... passou de novo... acaba de passar...

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Fechado

Uou, que nublada anda essa página! Tudo bem, eu me dou um desconto. A vida não é feita só de sol, estou sim um pouco mais sensível do que o normal, mas tudo isso faz parte do plano de ser mais eu. Paciência, constância e jogo de cintura. Me falta tudo isso, mas eu aprendo!

sábado, 10 de outubro de 2009

O cão bastardo

Num dia insatisfeito, numa maré de revolta, numa calmaria impiedosa, acabo de assistir Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino. A arte redime a vida real. Se eu fosse escrever o meu roteiro hj ia ser assim; “era uma vez um cachorro. Cansou de abanar o rabo e mordeu. Morreu com raiva. Feliz.” O sangue eu pedia emprestado pro Tarantino: já que a ideia é completamente fraca e a vida tb, algo tem de ter qualidade.

Agora sobre o filme: muito bom! Aquela loucura toda, a violência banalizada, personagens fictícios tão reais. Uma raiva incontida que faz extravasar. E um humor sutil, inteligentíssimo e, claro, negro. Ser ator num roteiro desses deve ser muito louco!

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Que situação...

Eu quero uma licença de dormir, perdão pra descansar horas a fio, sem ao menos sonhar a leve palha de um pequeno sonho - Adélia Prado

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Despertador

Ficaria de vigia se pudesse saber
Com exatidão a hora marcada de sol
Quando invade a luz e desperta
A inadvertida essência
Desse turbilhão sem nome

Desligaria com apenas um toque
Pediria mais dez minutos
Antes de pousar os pés no chão frio
Antes de estranhar o incômodo desconhecido
Não teria de escolher as cores
Não teria de saber as formas

Continuaria em repouso sereno
Sonharia as marcas por mim criadas
Viveria em meio à bruma
Sem receio de expansão, sem frio
Sem nada

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Nem um pingo

Silêncio
As palavras calaram
Não obstante isso,
Fazem um barulho ensurdecedor
Encontram-se escondidas
Em convenções secretas
Capazes de enlouquecer
Os que se atrevem a ouvi-las
Silêncio

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Do que me surpreende

O pé da mesa tem uma rosca que pode ser solta ou presa para acabar com aquele incômodo de ficar balançando... Descobri isso ontem. Tem tanta coisa que eu não sei. E me surpreendo ao saber que não sou mesa, mas tenho as minhas manhas para que as coisas deixem de incomodar ou fiquem como eu gostaria que fossem. Tem coisa mais boa e assustadora do que se surpreender consigo mesmo?

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Como uma porta

Se eu fosse menos teimosa, talvez fosse mais feliz também. Mas deixaria de viver coisas importantes. Ainda não entendo, então, se minha teimosia é vantagem ou desvantagem.
Tenho pensado em muitas coisas, ultimamente. Quase todas sem valor algum. Mas essas coisas têm me tirado o sono. Uns sentimentalismos bobos. Uns fatalismos que me matam. Perco tempo útil da vida considerando coisas quase sempre inúteis. Se eu pudesse parar de pensar e começasse a viver, talvez, seria mais feliz também.
Umas saudades infundadas. Umas recordações inusitadas. Umas suposições que quase sempre deságuam em nada. Viver dói. Como dizia Clarice Lispector, viver é tão incomum que só vivo porque nasci. Essa frase diz tudo numa clareza. E eu ainda tento entender.
As pessoas são estranhas. Eu sou a rainha das estranhezas. Quero tudo. Quando consigo não aproveito ou me canso muito fácil. Pq as coisas impossíveis me parecem tão mais saborosas? Sou uma menina mimada em frente à vitrine, esperneando e gritando: “eu quero”. Imperiosa. Sofrível. Pq aquilo é lindo lá na vitrine. Mas pode não caber na minha vida. Pode ser puro glacê. Gordura pra enganar os olhos e inchar o estômago. Mas eu sou assim, enquanto não cravar os meus dentes nisso, não me canso.
Ai, tem horas que daria tudo pra não ser eu. Dá uma gastura ficar batendo em teclas só pq quero. Ponto de honra. Sempre meus pontos de honra...

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Mais uma vez, a moça com sal no nome

Então, quando ela canta e eles tocam, ou melhor, quando brincam com as notas em palavras lúdicas de outras crianças, esqueço que a vida parece completamente sem sentido. Quando meus ouvidos se dão conta da beleza e dizem aos meus olhos que eles têm pouca ou nenhuma serventia, apesar de serem tão importantes, compreendo que não vou precisar de sentido ali sentada. Por isso, Roma instituiu a política do pão e circo. De barriga cheia e de alma saciada, ninguém quer revolução nenhuma. Saciado, o animal dorme, como escreveu Graciliano Ramos, eu acho. Se ela, se eles, se dispusessem a brincar pra que eu veja e ouça, pelo menos uma vez por mês, calariam essas vozes indiscerníveis. Curariam minha esquizofrenia sem diagnóstico, provocada por milhares de mim que não cansam nunca.
Não me canso de elogiá-los. Não me canso de lembrá-los. É como um encontro marcado. Mas não sou correspondida. E não me importo. O que importa é o que consigo extrair sem que percebam. Se eu fosse mais sensível, teria chorado e chorado a ponto de desespero. Graças a Deus, não sou sensível quanto acho que gostaria de ser. Sem isso, já sofro de sofrer. Invento e desenho sofrimento onde ele não está. E não sou capaz de dar forma a ele. Não sou capaz de dar forma a quase nada. E lamento muito...

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Aparências

Passamos o dia todo juntos. É ele quem me observa nos momentos de estresse e participa quando rio alto de alguma coisa engraçada. Há quatro meses tem sido assim. Religiosamente, passamos sete, oito horas por dia juntos. Apenas aos fins de semana, nos distanciamos. Mas quando retorno, lá está ele, impassível e cheio de vida a me esperar. Às segundas, faço questão de fornecer-lhe sustento. E ele agradece se tornando ainda maior aos meus olhos (e também aos olhares de quem o conhece), mais cheio de vida a cada dia que passa. Aliás, acompanho sua evolução com tanto zelo e carinho... A cada novo avanço ou centímetro de crescimento, me sinto recompensada e como se eu mesma tivesse crescido com ele.
Ainda que aos outros pareça espinhoso, para mim, ele é sinal constante de presença e amor. Basta olhá-lo para saber que sou amada, apesar de mim. Quando nos apresentaram, me disseram que nos daríamos muito bem. Não pelos espinhos que todos criticam em nós. Mas pela força e resistência que aparentamos ter. Mas nós dois sabemos que é só aparência. Os espinhos protegem nossa sensibilidade e fragilidade. Quando nos vimos a primeira vez foi como um amor instantâneo.
É assim o meu cacto, que ganhei de presente de um grande amigo e mora sobre a minha mesa no jornal!

p.s.: essa flor não é do meu cacto. Achei que se colocasse a foto dele, ia entregar logo a identidade secreta do meu novo romance! Hahahahaha. Ah, mas ele está lindo, verdinho e crescendo que só!

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Displicência

Perco as contas de quantas vezes por mês eu penso em largar tudo. Essa insatisfação constante ainda vai me custar tão caro. Já custa.

domingo, 13 de setembro de 2009

Nas alturas

Gosto de filme de criança. Já fui ao cinema sozinha assistir desenho animado e, pasmem, chorei. Então, natural até, que eu fosse assistir “Up – Altas Aventuras”. Natural até que eu chorasse. Mas não daquele jeito! Que beleza de animação. Que sensibilidade do roteirista e dos responsáveis pelos desenhos.
Ah, queria contar tudo aqui, mas para os meus poucos leitores que não viram, iria estragar as surpresas. Só quero destacar dois momentos: a sequência em que eles envelhecem. Maravilhosa!! Tentei não chorar, mas as lágrimas escorreram involuntárias. E a sequencia em que ele se desfaz de algumas coisas.
A gente planeja tanta coisa. Sonha com inúmeras situações, projeta. E se apega a elas. Quando não saem como a gente queria, pensa que foi tudo perdido. Tenho a sensação cotidiana que já perdi muito tempo. Que enterrei sonhos. Que mato todo dia um dia que poderia ter sido. Só que o até aqui foi vida. Mesmo que pareça só o seguir, prosseguir, o ganhar o pão todos os dias.
Tudo isso pra dizer que vale muito a pena ver “Up – Altas Aventuras”. Aviso aos mais sensíveis: segurem as lágrimas, o cinema vai estar lotado de crianças e não queremos assustar os pequenos!!

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Twitter (2)

Ou eu arranjo um trem desses ou vamos aos Twitter (100).

- Mais do pop: “eu não passo de um brinquedo desmontável”. Só que ninguém sabe brincar!

- Mais de Hilda Hilst:
“Quem és? Perguntei ao desejo.
Respondeu: lava. Depois pó. Depois nada.”

- Colo (entranhas) é irracional. Não quer saber se é consolo ou lava. Quer é ser impulsivo como se espera que seja. Não tem razão nem coração. Tem é a natureza urgente, caprichosa e sem reserva.

- Já falei de Cem Anos de Solidão, né?

- Ando meio saudosa de amigos, realidades, trabalhos, cidades, sentimentos...

- Tão bonitinha a Santinha e o Fio do Demo!

- Por que eu estou escrevendo aqui mesmo??

sábado, 5 de setembro de 2009

Twitter

Horas que eu queria ter um twitter pra dizer:

- O mundo está ao contrário e ninguém reparou.

- Eu não sou o que pareço ser, portanto, pro bem ou pro mal, sou uma farsa.

- Queria ser poeta. Tenho algumas sementes em mim, mas me parecem tão pobres.

- "Cem anos de Solidão" é realmente uma obra prima. Estou apaixonada pelo Coronel. Eu sempre me apaixono pelos coronéis. Mas eles têm de viver cem anos de solidão...

- Devia ter amado mais... (Nossa, como estou pop!)

- Esse não caberia no twitter, mas como isso é um blog, vai (estou pop e acabei de me apaixonar por Hilda Hilst, então os meus parcos leitores vão ter de suportá-la até que o encantamento se esvaia):

Ama-me. É tempo ainda. Interroga-me.
E eu te direi que o nosso tempo é agora.
Esplêndida avidez, vasta ventura
Porque é mais vasto o sonho que elabora

Há tanto tempo sua própria tessitura.

Ama-me. Embora eu te pareça
Demasiado intensa. E de aspereza.
E transitória se tu me repensas.

(Júbilo, memória, noviciado da paixão - Hilda Hilst)

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

A persistência da busca

Uma mistureira de coisas boas. O tempo anda colorido por aqui, apesar da chuva que cai amistosa lá fora. Ainda digerindo o retiro, um encontro revelador com o Homem, o Deus feito homem. Barulho incansável por dentro. Remoendo a leitura do “A Obscena Senhora D”, de Hilda Hilst (eu sabia que tinha de me encontrar com ela!). Hillé me falou das máscaras pintadas de sentimentos que deveríamos usar, talvez elas diriam mais da gente do que essa cara lavada. Ela me disse também dessa busca incessante. É preciso saber lidar com os nossos vazios, sem ignorá-los, mas sem deixar que nos tornem vazios como eles. A obsessão por encontrar pode matar a busca. Por outro lado, se alienar a ela pode deixar o ser humano raso rasinho...
Feliz meio sem explicação. Às vezes, isso dá um medo enorme. Mas não quero deixar de viver o bom por receio de que ele acabe. Eu sei que vai acabar mesmo. Na semana que vem, na próxima TPM, nas frustrações tão presentes em cada passo que dou, nas possibilidades que não saem do esboço feliz que eu faço do próximo fim de semana.
Tão bem, mas tão bem, que to pensando em limpar a casa amanhã. Deixá-la clara, cheirosa e fresca. Uma vez, a monja Coen me deu uma entrevista e disse que limpar a casa é bom para que a gente deixe também o interior em paz. A paz quer sair e cuidar da casa. A louca da casa está no jardim claro e cheio de sol.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Minha xará

Para compensar a ausência dos últimos dias, hoje vou aproveitar essa felicidade e inspiração aparentemente sem causa para escrever um pouco mais.
Qual criança não gosta de ser xará de alguém famoso ou ter o mesmo nome de personagem de novela uma vez na vida? Pois bem, eu, com esse nome um tanto quanto incomum (a não ser por Hitler), nunca tive esse prazerzinho bobo. O máximo que posso considerar um xará conhecido é Ariano Suassuna. Mas é homem, poxa!
Já estava conformada com o fato de que Gilberto Braga não teria uma protagonista Ariana, como Helena para Manoel Carlos, nem mesmo seria figurante de Malhação uma pobre Ariana.
Há um certo tempo eu estava numa procura por Hilda Hilst. Encanei que queria ler algo dela. Procurei em uma livraria, mas nada me chamava tanto a atenção. Até que uma busca despretenciosa me levou ao que ouço agora no meu rádio: "De Ariana para Dionísio". Zeca Baleiro reuniu apenas intérpretes das mais feras que eu já ouvi nessa vidinha para cantar Hilda Hilst. Rita Ribeiro, Verônica Sabino, Maria Bethânia, Jussara Silveira, Angela Rô Rô, Ná Ozzetti, Zélia Duncan, Olívia Byington, Mônica Salmaso e Angela Maria.
Ah, valeu a pena esperar tanto assim pra achar uma xará expressiva! Estou apaixonada por Hilda Hilst. Encantada com Ariana. Louca por Dionísio. Resumo: na mitologia Ariana ajuda um cabra a vencer o minotauro pq, tonta, estava apaixonada por ele. Fulaninho prometeu que se ela o ajudasse, ele a levaria consigo. Levou mesmo, mas abandonou na primeira ilha que encontrou pelo caminho. Então, sofrendo a tadinha da Ariana foi encontrada por Dionísio. Que se apaixonou por ela. Mas isso não ia prestar, né? Como é que se ama e se é amada por um Deus do Vinho, Senhor do Caos?
Hilda Hilst poetiza a espera e entrega de Ariana a um amor avassalador, uma paixão destruidora, aterradora e nascente de poesia. Dizem que Dionísio é a figura de um namorado da escritora, claro, representada por Ariana.
Isso tudo nas vozes de mulheres que dão vida à qualquer melodia (ah, vamos combinar, Maria Bethânia faz até "É o Amor" ficar aceitável, Ná Ozzetti acaba de fazer uma interpretação linda de Carmem Miranda e Mônica Salmaso..., ah a Mônica - hahahahaha, isso sem contar Olívia, Zélia, Angelas...). Um time feminino que garante maturidade e paixão à letra da nada politicamente correta Hilda Hilst. Eu vejo Ariana, "tão simultânea madura e adolescente". Não sei se me conformo aos poemas só pra ser mais minha xará ou se é pq sou assim intensa como ela.
Ah, que coisa linda. Isso que me faz ficar assim feliz sem ter motivo, eu acho...
Só um poema pra deixar com vontade:

VI
Três luas, Dionísio, não te vejo.
Três luas percorro a Casa, a minha,
E entre o pátio e a figueira
Converso e passeio com meus cães
E fingindo altivez digo à minha estrela
Essa que é inteira prata, dez mil sóis
Sirius pressaga
Que Ariana pode estar sozinha
Sem Dionísio, sem riqueza ou fama
Porque há dentro dela um sol maior:
Amor que se alimenta de uma chama
Movediça e lunada, mais luzente e alta
Quando tu, Dionísio, não estás.

Fez-se Mar

Devagar, quase sem que se perceba, chega. Assim, como quem não quer muita coisa, só um lugar. Esparrama e ganha espaço. Esparrama e ganha prioridades e transforma realidades. Imprime sulcos profundos, estabelece-se em todas as relações. Há traços da sua presença no sorriso, no olhar, no gesto. Sem que se perceba, torna-se razão primeira, motivo maior, motor e motriz. Apesar disso não faz refém, liberta sempre. É sinal cantar de manhã, sonhar à tarde no meio do expediente ou perder o sono. É sinal também sofrer em silêncio, chorar escondido ou querer dormir eternamente. Contém em si toda salvação do mundo e é também responsável por revoltas que desfazem realidades antigas. É sinal divagar sem causa...

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Laços...

Éramos feito Tico e Teco. Naqueles meus primeiros anos na faculdade, Theresa me emprestou dinheiro, me emprestou o carro, me deu colo e ombro. São inumeráveis as cenas que carrego e carregarei comigo. No dia histórico 11 de setembro, vimos as cenas do WTC pelas telas das tvs à venda no Wall Mart, quando eu matei aula não me lembro porque, mas estávamos lá comprando alguma coisa. Bom, se estávamos comprando e eu matei aula, ela não estava nada bem! Teve uma vez que comemos coisa de 72 pasteizinhos (daqueles vendidos prontos pra fritar) pq estávamos tristes. Um dia, ela levou um CD, colocou pra tocar, subiu na bancada da cozinha e começou a dançar e cantar desvairadamente Mr. Big. Perdi as contas de quantas madrugadas perdemos ao telefone. Quando me levaram do bolso o único dinheiro que tinha em uma passagem por São Paulo, foi pra ela que eu liguei a cobrar só pra ouvir uma voz familiar (detalhe: eram 7 horas da manhã e Theresa morava em Goiânia, na época). Até hj dou risada sozinha quando lembro dela bêbada pensando que estava ficando cega pq eu disse a ela que o sol já tinha nascido e estava tudo escuro, ela acreditou! Quando Theresa se formou, na noite anterior à sua ida de Bauru, choramos feito crianças, sem palavras. Tantas coisas...
Mas a vida se abre sempre num feroz carrossel, como diz Toquinho, e nos afastamos. Ontem, conversamos pelo msn, depois que o carrossel nos trouxe aqui. Não há tempo que supere a sinceridade de um laço fraterno, quando real. O diálogo final foi mais ou menos assim:
Theresa - Assisti Ensaio sobre a cegueira
Eu - Bom, muito bom o filme
Theresa - Ah, muito sério. Vc sabe, não sou muito cult
Eu - Eu finjo que sou. Faz parte do meu show
Theresa - Sim, resquícios da sua vida unespiana. Mas eu sei que é tudo fingimento. Bjos!
Eu - Hahahahaha... Bjos!
Me vieram à mente todos esses momentos, como uma onda incontrolável. Ela sabe. Conhece a essência dessa mutação ambulante. Essência não muda e os que tiveram acesso a ela uma vez podem entrar e sair a qualquer momento, retirando de dentro de mim o que há de melhor. Essas pessoas souberam suportar o pior de mim, têm todo o direito! Bem-vinda de volta, Theresa!

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Cotidiano

Um dos momentos mais agradáveis do dia é a hora do almoço aqui no jornal. Discutimos a vida, bobagens, política, coisa séria, motivos, sentidos, nos criticamos (muito!), tentamos nos cuidar. E me sinto muito mais parte de alguma coisa que não sei descrever. Talvez seja a história se fazendo no cotidiano aparentemente tão bobo. Hoje, falamos sobre sair da inércia, mudar o curso, tomar as rédeas. Fiquei a tarde toda pensando nisso.
Ajudou a pensar um pouco reencontrar uma colega de faculdade, ela acompanhava um entrevistado que veio nos visitar. Fazia cinco anos que não a via. Nem tivemos contato próximo durante os anos em Bauru, mas revê-la foi rever aquela história, aqueles quatro anos tão inesquecíveis. Abraçá-la foi abraçar cada uma das pessoas que de alguma forma me construíram durante aquele período no campus da Unesp Bauru.
E, agora, estou ouvindo a Ceumar, em uns versos que ela fez, tão bonitos (Meu Nome), e rindo das coisas aqui na redação, brincando com os que me veem todo santo dia, feliz, triste, carrancuda, tonta...
Nossa que mistureira. É só que quando a vida resolve conter num dia me dá uma alegria meio triste, uma mescla de inconformismo com uma comodidade de conhecer. Ah, parece um samba ou bossa nova. Parece música.

Complemento

Em mais um momento tietagem piegas e kitsch, aqui está a matéria, publicada hoje no Diário da Região, sobre o "Noites de Gala, Samba na Rua - Ao Vivo". Vou aprender a colocar áudio aqui e postar a entrevista que está gravada...

Mônica Salmaso e grupo Pau Brasil estão em disco ao vivo

Ariana Pereira
São José do Rio Preto, 18 de agosto de 2009

Grupo Pau Brasil e Mônica Salmaso: trabalho rendeu 2 CDs e um DVD

Dificilmente, eles serão vistos em um programa de televisão ou ouvidos em uma estação de rádio qualquer. Apesar disso, o grupo Pau Brasil e a cantora Mônica Salmaso conseguiram, em menos de dois anos, lançar dois CDs e um DVD, além de realizar uma turnê que percorreu 21 cidades, de abril a novembro do ano passado. Para fechar o ciclo de tanta estrada, foi gravada a versão ao vivo de “Noites de Gala, Samba na Rua”, trabalho em que o grupo e Mônica interpretam composições de Chico Buarque com parcerias de Edu Lobo, Guinga, Tom Jobim e Vinicius de Moraes. Teoricamente, “Noites de Gala, Samba na Rua” é o mesmo produto em três versões: estúdio, DVD e versão ao vivo. Teoricamente. A recém lançada versão ao vivo tem sutilezas que não podem passar desapercebidas por quem gosta de música e tem ouvidos sensíveis para um trabalho de entrosamento entre os músicos que se apresentam: a voz única de Mônica e a técnica impecável do Pau Brasil.“As músicas são as mesmas, com exceção de ‘Quem te viu quem te vê’, pois houve um problema técnico que impossibilitou inclui-la na versão ao vivo. As únicas diferenças estão em ‘Flor da Idade’ e ‘Moda do Pau Brasil’, que foram acrescentadas. Para mim, essa versão ao vivo é algo de registro. Existe uma diferença em fazer um disco dentro do estúdio e fazê-lo ao vivo. Principalmente, depois de ter feito toda a turnê. O CD ao vivo é mais quente, mais maduro, nossa forma de tocar é mais madura, existe o calor do momento”, afirma Mônica Salmaso.
Divulgação
A cantora era contra a gravação do CD ao vivo, uma vez que, quando teve início a turnê, os arranjos e vozes apresentados no palco estavam absolutamente iguais ao trabalho gravado em estúdio. Com o passar da estrada e do tempo, o grupo Pau Brasil e Mônica se viram mais à vontade para improvisar e interpretar as canções de Chico de forma mais solta e diferente do que havia sido gravado. “O CD foi gravado no dia 3 de outubro. Já tínhamos tocado tantas vezes que há detalhes, tem um jeito de tocar e cantar muito menos preocupado em fazer correto e curtindo mais. É uma sensação de ciclo fechado, o registro final do amadurecimento de um trabalho.” Durante a turnê, o grupo passou por Rio Preto, no Teatro Municipal Humberto Sinibaldi Neto. Ao longo dessas apresentações em cidades pelas quais nunca havia passado, Mônica afirma que foi possível ter uma dimensão do alcance do trabalho que realiza. “Não é o caso de Rio Preto, mas fui a muitas cidades em que nunca havia feito um apresentação. Pelas conversas com as pessoas, após os shows, fiquei com uma sensação boa de que existe um circuito que acontece fora da televisão. Nesse sentido, a internet, o Orkut, Youtube são geniais, possibilitam uma vazão muito democrática do que se produz, pois formam uma rede de pessoas que têm interesses comuns e a divulgação espontânea de um trabalho. Isso é muito legal”, diz a cantora. Além de tornar possível o contato com um público do qual Mônica não tinha muita dimensão, “Noites de Gala, Samba na Rua” fez com que o grupo Pau Brasil e a cantora passassem por diferentes teatros brasileiros. Por isso, excluir “Quem te viu, quem te vê” da versão ao vivo veio a calhar: não houve nada de samba na rua durante a turnê. “Passamos por lugares muito lindos, por salas históricas. Fizemos um circuito de música de câmara, teatros de gala mesmo. Isso tem um significado muito bonito. Foi uma costura de salas, a preços populares, que é o ideal, assim todo mundo pode ver. Gostaria de refazer essas cidades com um próximo projeto.”

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

De novo ela

Como ela conseguiu aperfeiçoar o perfeito? Essa minha exorcista particular consegue o inexplicável! Fantástica a versão ao vivo de “Noites de Gala, Samba na Rua”, Mônica Salmaso e Pau Brasil. Vale muito, muito a pena! Basta ouvir uma vez ao dia pra expulsar os diabos mais improváveis.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

No lugar errado

Retinha-me longe de Vós aquilo que não existira se não existisse em Vós – Santo Agostinho

Antes de ser o santo Agostinho, o rapaz foi fogo. Acho uma graça quando ele reza: “Senhor, dá-me a graça da pureza, não pra hoje.” Agostinho entendeu o que tantas vezes é a minha inquietação. É muito difícil aceitar que basta Deus e que as outras coisas se ajeitam ao redor disso. Para os que não acreditam em Deus, é difícil aceitar que a felicidade, realização, o algo mais, enfim, aquela busca que parece não ter fim se encerra dentro de si mesmo. No castelo interior. Lugarzinho de difícil acesso, apesar de ser tão pertinho.
Então, quando me esqueço que tenho dentro de mim o que preciso, me perco. Fico feito barata tonta, refazendo os passos, na esperança de encontrar o que me roubou de mim, o que foi que eu fiz, me fizeram ou aconteceu para me tirar do rumo. Claro que não encontro. Só me dou conta quando me deparo com situações que me devolvem para dentro de mim. Hoje isso aconteceu. Foi tão simples. E voilà! Cá estava eu, de volta pra mim. Ainda um pouco desnorteada, mas com a clareza sobrenatural de que estava de volta. E aí, começa um período que eu gosto de chamar de convalescença (lembro do meu cachorro quando ficou doente e quase morreu, depois de melhorar, ficou uns dias meio fraquinho, na corda bamba, até voltar a pular desembalado como sempre fazia).
O ser humano procura fora o que está dentro. Por isso se perde. Eu vivo me enganando. Vivo escorregando pra fora de mim. E pobres dos que me rodeiam nesses períodos. É quando eu realmente preciso ser amada...

domingo, 9 de agosto de 2009

Um filme, talvez, bom

Desde pequena, sempre tive a impressão de que atuava como personagem principal de um filme, um livro. Era como se contasse uma história. O tempo passou, as coisas de criança vão se tornando cada vez mais lembranças que parecem de outro século (e realmente são!), mas algumas coisas, vez ou outra, voltam à memória. Essa impressão de ser parte de uma história de livro nunca morreu. Amadureceu, mudou de nome, trocou de roupa. Mas, em alguns momentos, tenho a sensação nítida que vivo algo que vejo lá da frente, de uma velhice que me aguarda, mas já é real. Coisa doida... Ah, não se deve levar a sério coisas escritas quase às duas da manhã, na casa de pai e mãe, depois de encher bexigas com a irmã mais nova e pendurá-las na copa com um bilhete de "Feliz Dia Dos Pais".

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Da simplicidade que transforma o mundo

Na última segunda-feira, eu e minha amiga Michelle fomos convidadas para falar a respeito de comunicação para um grupo de pessoas que dão início a um trabalho que considero pioneiro. Essas pessoas foram convidadas pelo Frei Paulo (padre responsável pela paróquia na pequena cidade de Nova Aliança e meu amigo) a integrar uma equipe de ministros da Palavra. Em linhas gerais, essas pessoas são como o padre, mas não podem consagrar a Eucaristia. Mas vão poder fazer homilias, comunicar ao povo que vai à missa o Evangelho.
No fim da reunião, uma senhora de uns 70 anos, talvez um pouco menos, me procurou. Bem tímida, ela disse como quem comenta sobre o tempo, mas apreensiva:
- Vamos ser bastante criticadas, né?
Eu, com a minha pressa ridiculamente imprudente, presumi burramente que ela tratava de críticas quanto a falar em público.
- Ah, não tem importância. As críticas são bem-vindas pois nos aprimoram
- Acho que as pessoas vão estranhar uma mulher falando no lugar do padre. É estranho. - Ela disse tão encolhida e olhando para o chão que consigo ver nitidamente esse momento.
Novamente meu ímpeto:
- Quantos catequistas homens vocês têm na paróquia?
A amiga dela, que ouvia a conversa, respondeu prontamente que, de 9 catequistas, um era homem. Corri a dizer com aqueles ímpetos de arrebatamento que me ocorrem vez ou outra:
- Fui a um encontro no ano retrasado. Nele, estavam mulheres nordestinas que tocam paróquias inteiras pela falta de padres. Apenas não consagram. Mas são elas que fazem a comunidade acontecer. As mulheres carregam há anos a Igreja nas costas. A senhora pode se considerar uma pioneira na cidade. Uma mulher que sobe ao altar pra falar do Evangelho.
Ela não me levou muito a sério. Saiu carregando um receio nos ombros. O que ela não sabe é que foi ministra da Palavra pra mim. As revoluções são silenciosas. As mudanças são feitas por pessoas como aquela mulher que aceitam, com o receio do mundo sobre os ombros, desafios que não compreendem e se submetem a eles com uma humildade invencível.
Aquela senhora pode ser mil vezes melhor do que qualquer padre, mas nunca vai se deixar levar por isso, nunca vai acreditar que é melhor. Isso faz dela infinitas vezes capaz de transformar a história. Será que com os anos aprendo a ser um pouco capaz?

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Sobre o incompreensível

A Bianilda foi à exposição de Sophie Calle, Cuide de você (depois de tomar um clássico fora por email, a moça resolveu pedir que outras pessoas a ajudassem a compreender a situação. Pq vamos combinar, se as outras pessoas não nos ajudam a entender essa hora fica meio complexo mesmo). Como as histórias são milhares, milhões. Como os fins são sempre os mesmos. A gente não se entende. A gente só pensa na gente. A gente não sabe amar. É assim.
Sentença cega, né mesmo? É que reconheci na carta-fora do ex da Sophie os foras que levei, os foras que dei. Claro que os foras masculinos são muito semelhantes. As frases só mudam de lugar no texto ou a ordem, passam de diretas para indiretas, mas o conteúdo é o mesmíssimo.
De qualquer forma, achei interessante a iniciativa. Fazer do desastre a escada que eleva. Ou o sucesso. O fulaninho que dispensou a Sophie com ares de injustiçado nem imaginava o que ela faria. Eu queria ter a criatividade dela! Fantástica! Mas ainda sou do time que fica pedindo ajuda pra entender e segue sem entender.
Não aconteceu nada em relação a esse assunto ultimamente. Mas é que a postura de Sophie me deixou bem pensativa. Aliás, o email do rapaz pra ela me deixou bem pensativa. Como a gente é estranha...

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Só pra ver o sol

Uma casinha branca de varanda. Só isso. Bem no meio do nada, do mato. Com comida, livros e música. Internet tb que isso acaba fazendo falta uma hora. Um labrador, um golden e e uns dois vira-latas esparramados pelo quintal, com muitas árvores, pomar. Longe de tudo. Escondida de tudo. No meu “infinito particular”, comigo, uns amigos vez ou outra. Mas só os amigos mesmo. Só alguns. Nada, nada mais.

terça-feira, 28 de julho de 2009

O fim


Acabou! Finalmente. É bom e ruim. Bom pq retomo minha rotina (nossa, como estou ficando velha! Eu que amo uma quebra de rotina não via a hora de voltar para a minha!). Ruim justamente por isso! Mas, enfim, pra terminar, as peças que não coloquei aqui.
Avner, the eccentric – bonitinho. O Avner é bom, mas eu não estava com espírito para aquelas gracinhas de circo. Enfim, eu talvez tivesse gostado mais se estivesse na vibe.
Inveja dos Anjos – Lindo. Cenário maravilhoso, Texto de uma poesia e sensibilidade únicos. Patrícia Selonk me fez pensar que era mesmo Cecília. A história de alguém que ficou para contá-la. Me emocionou muitíssimo devido às minhas questões interiores, que foram fomentadas demais por fatos pessoais, na minha casa. Fiquei muitíssimo tocada, muito sensível, me segurando pra não cair aos prantos a qualquer minuto.
De qualquer forma, se tivesse de escolher apenas uma para ver de novo, escolheria Rainhas. Não sei pq. Acho que tudo em Rainhas mexeu comigo. O visual, o texto, a disputa, a história. O FIT, neste ano, foi melhor do que no ano passado. As peças me desinstalaram mais, me fizeram pensar mais na vida. Como se eu já não fizesse isso o suficiente para viver em crise!!! Mas está valendo. Estou sem inspiração para escrever. O momento não é o melhor para isso. Não publicamente! Ah, na foto, a moça sorrindo é a Patrícia Selonk. Não sei o nome das outras atrizes...

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Quase o fim


Tirando forças do fundo da minha velhice pra terminar o festival. Cansada, cansada... Não vejo a hora de voltar pra minha vida “normal”. Com uma linha de amargura pq apesar do cansaço, essa semana foi muitíssimo boa: trabalho legal, amigos por todos os lados, peças boas, enfim. Sigo com as minhas impressões (se é que elas valem alguma coisa).

Pena que acabaram:
- Rainha[(s)], Duas Atrizes em Busca de um Coração – não consigo parar de pensar nesse espetáculo. Que lindas a Isabel Teixeira e a Georgette Fadel. Lindas! Já fui pra essa peça muito desarmada, pois escrevi sobre ela depois de conversar com a Isabel. A simpatia encarnada, essa moça! O texto, a atuação, o visual, a música, o drama e o humor. Tudo muito bem encaixado, bem trabalhado. Coisa linda! Inesquecível!
- In on It – Bem legal tb. Meio emburrada com o Henrique Diaz. Mas “pequeninices” à parte, os dois estão ótimos. Emílio de Mello impecável! Muito legal como as histórias se costuram.
- Tercer Cuerpo – Fora o sotaque argentino que é um trem estranho, os cinco atores conseguiram me passar a sensação estranha do terceiro corpo, do questionamento de “como as outras pessoas fazem?”.

Não foram ruins, não foram ótimas:
- Falecida Vapt Vupt – O texto é muito legal, os atores bons também. Mas a música constante ao fundo “Alegria...” e o barulho dos figurantes conversando no bar sem parar me atrapalharam um bocado. Cansativo por ter de me concentrar demais. Talvez, se eu já não estivesse carregando o cansaço do trabalho eu teria aproveitado melhor.
- Apropriação – Legal. Os atores muito bons. Foi bem investido o meu tempo.
- Esta Propriedade Está Condenada – fiquei encantada com a atuação de Susana Ribeiro e Pedro Henrique Monteiro. Mas o espaço não foi legal com eles. Começou e acabou muito rápido e a correria atrás deles pelo quintal impediu um pouco que eu aproveitasse a peça.

Na foto, Georgette Fadel e Isabel Teixeira, como Elizabeth I e Mary Stuart em Rainhas. Está acabando. Faltam apenas After Darwin, Bate Man, Inveja dos Anjos e Avner. Não sei se é bom ou ruim acabar. Mas acho que o meu corpo e minha cabeça não dão mais conta. Infelizmente, o tempo passou pra mim!

terça-feira, 21 de julho de 2009

Uma falta de tempo incrível


Correria boa do lado de cá. Além de aproveitar o Festival Internacional de Teatro de Rio Preto, neste ano estou trabalhando com a cobertura para o jornal. Aliar trabalho com algo que a gente gosta é realmente uma coisa inexplicável de boa.

Peças que merecem destaque de sexta-feira até hoje:
- Comunicação a uma academia com Juliana Galdino: texto complexo, eu achei que não ia conseguir gostar (afinal de contas sou tão profunda quanto um pires). Mas ela dá um show de interpretação (não à toa foi indicada ao Shell com essa apresentação), incorpora um macaco, um homem, uma entidade! Bom início de festival
- Caminho para Meca – Cleyde Yáconis um show à parte. Essa peça teve um gosto bom. Eu tinha muitas expectativas, pois conversei com a atriz pra capa do jornal de domingo. Linda, dá vontade de ficar conversando, levar pra casa! A peça maravilhosa, envolvente e de uma singeleza indescritível.
- Neva – A interpretação dos chilenos me deixou sem respirar em alguns momentos. Coisa de outro mundo! Simplesmente fantástico. Tipo de peça que faz a gente sair do teatro com um silêncio de admiração, respeito e indagação: “putz, quem eu penso que sou, o que eu penso que estou fazendo da vida, pra onde é que eu acho que estou indo?”


Não veria de novo:
- Silêncio dos amantes - visual bacana, mas não gostei das interpretações e tem drama demais. Trabalho com texto de autoajuda todos os dias, não precisava ver isso no palco.
- Senhora dos Afogados (Núcleo Experimental) - como assisti à apresentação montada pelo Antunes, no ano passado, tinha uma comparação desleal. O texto, por si, já é complexo, exige interpretação muito boa, o que não é o caso desse grupo. As músicas não me convenceram, assim como os atores, a Moema e todo mundo. A ressalva são as duas músicas interpretadas pelo grupo todo: ficaram boas. E só.
- Crônica de José Agarrotado: Nil. Nil é nada. Uma coisa diferente, mas não iria se soubesse que era assim. Não tem explicação. Um trem que me fez entrar e sair do mesmo jeito do teatro.


Coluna do meio:
- A Margem: quando começou, pensei: o que estou fazendo aqui, minha gente? Mas ganha espaço pela graça com que se faz referência à arte. Principalmente, quando remete ao cinema. Muito bonito e sensível. Talvez veria novamente partes isoladas.


Na foto, estão Jorge Becker, Trinidad González e Paula Zúñiga, em Neva. E é isso! Hoje, tem “Esta Propriedade Está Condenada”, da Cia dos Atores. Expectativa grande.

p.s.: não sou crítica de teatro, não sou crítica de coisa alguma. Cada um sente o espetáculo com as próprias experiências e isso é lindo! Se não fosse assim, não haveria tanta gente com tanta opinião diferente. O que escrevi aqui é só quem eu era quando assisti a essas peças.

domingo, 12 de julho de 2009

Só pra reforçar...

... quem inventou a amizade estava mesmo muito inspirado! As vozes conhecidas, engraçadas, reconfortantes. As frutrações esparramadas, desmascaradas e tratadas. O carinho sem intenção. O amor desinteressado cheio de interesse por colo. O olhar que sabe antes que a boca se abra pra jorrar desconexões. Ah, a sabedoria antecipada! O encontro que favorece a "plasticidade" do cérebro.
Descobri essa semana que um bom círculo de amizade é capaz de fazer nascer neurônios e melhorar as sinapses! E tem gente que defende só a prática de atividades físicas... Meus amigos me fazem alguém com cada vez mais massa cinzenta!

p.s.: o FIT chegando aumenta a expectativa do encontro. O telefone que toca na madrugada também faz a gente ser mais grata por ter amigos.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Tênis nos pés errados

Quando uma história chega ao fim e se tem de recolher os cacos, é difícil avaliar o real estrago que ficou. Seca-se o chão, limpa-se a desordem provocada pela tempestade, guarda-se os cacos maiores e vai-se colando, aos poucos, o que em minutos foi despedaçado. Repara-se pouco nos pequenos detalhes, quando o estrago é maior do que a gente mesmo. Lamenta-se o desastre.
Hoje reparei em pequenas coisas. E estou lamentando profundamente por isso: gastei a música certa com o amor errado. Que pena! Hoje, esse é o meu maior lamento. Não lamento o chão que faltou, isso me fez aprender a voar. Não lamento os castelos que desmoronaram, isso me ensinou a refazer. Não lamento as feridas, elas me deixaram mais sensível e madura. Mas a música... Ah, era a música certa.
Eu poderia ter investido tudo (como fiz e isso é perdoável!). Eu poderia ter investido todos os meus sonhos, eles são recicláveis. Minhas emoções, elas são autocuráveis. Meu amor, ele se multiplica. Mas a música... Ah, a música já estava pronta, não tem como mudar.
Se eu tivesse de chorar hj pelo que passou, choraria pela música. Era minha, eu não tinha nada de dá-la a ninguém. Podia ter entregue a possibilidade de ser feliz, podia ter entregue meus amigos (eles serão sempre meus!), meus pais, até o meu cachorro. Mas a música nunca mais vai ser só minha. E isso é lamentável. Pq só eu sei dar a ela o valor que acredito real.
Não entrego mais minhas músicas. Tudo o mais é recuperável, reciclável e pode ser refeito com muito mais grandeza. Mas música... Ah, música não tem jeito. Hoje, lamento pela música e não há melodia que me console...

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Palavra de canalha

Li esse texto no livro "Canalha!", de Fabrício Carpinejar (que se pode conhecer melhor aqui. Vale a pena). Ele conseguiu pegar a essência da coisa... Gi, esse vai especialmente pra vc! E vc sabe o porquê!!

Não me apresente aos amigos

Amor não é caridade nem filantropia. O que ofende a solidão é alguma amiga chegar e comentar: “Tenho um amigo pra te apresentar”. Ela não está consultando sua opinião, não pede uma resposta, já marcou o encontro e a descreveu ao pretendente. O panorama recrudesce se o programa não é a dois, mas assistido, com a participação de outros casais a narrar, comentar e fazer “hola” a cada aproximação. Desde quando solteira é atração de circo?
“Tenho um amigo pra te apresentar” é a frase mais escabrosa que se pode ouvir. Uma forma de chamá-la indiretamente de encalhada. Mais agradável designa-la gorda. A amiga se julga uma Madre Teresa de Calcutá, distribuindo riquezas aos pobres e diminuindo a desigualdade. Deseja ajudar, mas, no fundo, atrapalha. Em nenhum momento, cogita a hipótese de que se está muito bem sozinha.
Pelo fato dela estar com namorado ou casada, não suporta que alguém esteja solteira. Quer exterminar as solteiras da cidade, pois não é suficiente casar; o mundo tem de casar junto com ela para não se arrepender ou questionar sua rotina.
A solidão é também uma escolha. Infelizmente, em nossa cultura casamenteira, é filtrada como uma inabilidade em encontrar uma cara-metade, é vista como incompetência amorosa.
Quando se escuta “tenho um amigo pra te apresentar”, lamenta-se não ser avestruz ou toupeira para se esconder em um buraco.
Perderá o controle da própria vida, a pose, o orgulho, o luxo da iniciativa. Ela inicia uma campanha de mobilização, em que todos saberão que está disponível. Lança-se um pedido de socorro, e a pretensa afogada toma sol na areia. Com a fragilidade escancarada, vexame é pouco, será difamada nos almoços familiares.
“Tenho um amigo pra te apresentar” indica, ao mesmo tempo, que não desfruta de condições para conseguir sozinha e pelos seus méritos uma paixão.
Sua independência é confundida com carência, seu apartamento, com oferta do Sine (Sistema Nacional de Emprego).
Amor encomendado nunca funcionou. Como fazer render um encontro em que a expectativa mínima é a de namoro e a máxima de um casamento? Amor surge ao léu, de imprevisto, sem nenhuma preparação psicológica e pesquisas de opinião.
Não se passa por teste vocacional, o amor pode contrariar a carreira.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Ingressos

Ainda estou assustada! Consegui comprar todos os ingressos que queríamos para o FIT. Em menos de 8 minutos!!! Só ficou uma de fora por causa da minha falta de atenção. Mas deu tudo certo! A infra-estrutura que montamos foi coisa de filme! Com direito a tele conferência ontem à noite e tudo! Foi lindo! Huuummm, chegando a hora de me acabar no festival. Que alegria!

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Preparativos

Essa coisa toda do Festival de Teatro (FIT - São José do Rio Preto) é como umas férias no meio do ano. Não que eu não trabalhe. Pelo contrário, dá um cansaço imenso porque trabalho o dia todo, depois tem as peças às 19h e 21h30, sem levar em consideração os dias que resolvemos ir ao Não-Lugar (bar do festival). O mais bacana, sem contar as peças boas, é toda a preparação que fazemos. Trocamos ideias sobre quais as peças compensa ver, montamos um cardápio cultural que vai ser modificado umas 20 vezes antes de realmente comprarmos os ingressos das peças. Hoje à noite, vamos nos reunir para definir o cronograma. Como se isso fosse a coisa mais importante do mundo. E é! Para o nosso mundo, isso é o que vale no dia de hoje! É como se fosse a organização de um grande encontro. E como é um grande encontro! Minha casa já está com todos os cantos reservados. Nos próximos dias chegam minha irmã, meus amigos, meus irmãos... A casa cheia por, no mínimo, uns cinco dias. Movimento garantido de 17 a 25 de julho. Que bom!!Por isso a arte ainda há de redimir o mundo. Por ela mesma e pela capacidade que tem de congregar os diferentes, os iguais e os semelhantes! A festa começa hoje!

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Súplica

Senhor, me afasta da tentação de ser igual. Não deixe que eu me acostume aos rótulos e livrai-me sempre de ser o que esperam que eu seja. Amém!

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Tão efêmero

Ah, eu até que podia escapar disso. Mas foi tanta exposição que não tinha como ficar isenta. A gente só acha que não está suscetível à produção em massa. Besteira. Morreu ontem um dos maiores nomes da música mundial, o "rei do pop", como é conhecido, Michael Jackson. Eu tenho cara de quem curte Michael Jackson? Não, claro que não! Mas tenho mais músicas dele no arquivo musical do meu cérebro do que imaginava.
Com a morte repentina, saltaram em todos os canais, como propaganda eleitoral gratuita, imagens e músicas de todos os tamanhos e tipos do astro. Cada ritmo, cada letra, cada dança, foram, aos poucos, retirados dos meus "arquivos confidenciais". Não é pra menos: nasci em 1981, a década de 80 foi o período áureo de Michael Jackson. Querendo ou não, cresci ouvindo as músicas dele, vendo os clipes no Fantástico. Quantas vezes meu cérebro infantil ouviu Thriller? Ou Billy Jean? Minhas retinas viram aquelas sapatilhas deslizarem pela TV em quantas ocasiões? Mesmo sem querer, assim como as pessoas da minha geração, vi Michael Jackson aparecer cada vez mais branco na TV. Ouvi as histórias mais cabulosas a respeito dele, como a lenda de que ele passava horas em uma bolha de oxigênio para clarear a pele. Também assisti, ainda que desatenta, as notícias sobre o casamento com a filha de Elvis Presley, o filho balançado na sacada, os supostos envolvimentos com crianças...
Eu disse para alguns amigos que sentimos a morte desse desconhecido pq a memória registrou tantos momentos com os quais identificamos as músicas dele que é como se essas recordações fossem lesadas. Por isso, (eu, pelo menos) sentimos a perda. Não muda nada, mas que fica uma sensação esquisita de que a vida é passageira demais e de que os anos passam, ah, fica!

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Inerte

Quando a vida me paralisa. Aquela sensação de abismo bem embaixo dos pés. Não um abismo que traga. Um abismo de montanha russa! Estática!

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Como assim?

Reportagem publicada hoje na Folha de São Paulo. Quando o absurdo torna-se aceitável e fecham-se os olhos para a dignidade humana...

Crianças de Marajó se prostituem por hot dog
Cidades da ilha no Pará convivem com a prostituição de meninas; após denúncia, fiscalização aumentou, mas não resolveu problema Jovens com menos de 18 anos percorrem ruas e festas e se vendem por dinheiro suficiente para uma cerveja ou para se divertir à noite
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, NA ILHA DE MARAJÓ
No grupo há mais de dez meninas. Elas andam sozinhas, depois da meia-noite, pelas ruas vazias de Breves, a maior cidade da ilha de Marajó, um arquipélago de 104 mil km2 no norte do Pará.Elas gritam e dão pulinhos, animadas pela festa logo ao lado, próxima à zona portuária, num galpão com mais de sete metros de pé-direito, todo feito de madeira -como boa parte das construções na cidade.Não parecem ter mais do que 15 anos. Mas, como é comum em Breves, vestem roupas de adultas: shorts que não chegam à metade das coxas, blusas minúsculas. Na festa, diz uma placa, menores não entram, mas ninguém pede seus RGs.
Dentro, na semiescuridão, elas se mesclam às centenas de pessoas, a maioria delas mais velhas, atingidas pela potência de uma caixa de som do tamanho de uma parede, que toca os hits recentes do "melody", uma variação do tecnobrega, música que mistura batidas eletrônicas com ritmos caribenhos.
O repórter está próximo de duas meninas do grupo. Afirmam ter 17 anos e pedem uma cerveja. Pouco depois, sem constrangimento aparente, dizem de maneira seca que, se ele pagar a bebida, poderá escolher uma para sair dali.
A prostituição de adolescentes e crianças na Ilha de Marajó foi formalmente denunciada ao governo federal em abril de 2006 pelo bispo local (leia abaixo), mas a fiscalização, que aumentou, não brecou uma situação já enraizada.
A reportagem passou cinco dias na região e viu que crianças e adolescentes se prostituem por dinheiro suficiente para se divertir à noite ou consumir artigos como roupas, celulares ou um simples hot dog.
Em cidades com alguns dos piores IDHs (Índices de Desenvolvimento Humano) do país, o dinheiro parece corromper mesmo quem, à primeira vista, não tem nada a ver com o negócio do sexo.
Dependendo do valor, um taxista pode se tornar agenciador de adolescentes, e um vigilante de rua pode tentar arranjar um local para o encontro ocorrer.
Não há exatamente prostíbulos em Breves ou em Portel, outra cidade visitada pela Folha. As meninas são "arranjadas" por terceiros ou estão pelas ruas, por vezes abordando o "cliente" em potencial, sempre como se pedissem dinheiro.
Logo após a festa, quando voltava para o hotel, em cujas portas há o aviso de que é proibido entrar com menores, o repórter encontrou Maria (nome fictício) sentada numa calçada.Pelo rosto, ninguém diria que ela tinha os 17 anos que afirmou ter, e sim que mal havia completado 14. Imediatamente, pediu R$ 10. Com a recusa, pediu R$ 2. Para quê? "Queria ir até ali comprar um cachorro-quente." Em troca, afirmou, aceitava fazer um programa.
A Prefeitura de Breves disse que mantém programas para tirar as adolescentes das ruas.Longe dos centros urbanos, nas imensas zonas rurais das cidades da Ilha de Marajó, dominadas pelos rios que cruzam o arquipélago, é possível ver as meninas ribeirinhas se aproximando de balsas com passageiros, remando em "casquinhos" -canoas pequenas e frágeis.
Levam açaí para vender, mas podem fazer sexo em troca, por exemplo, do óleo diesel usado para os geradores de energia das casas, como disseram moradores e barqueiros.Já em Portel, elas se reuniam numa rua apelidada de "xirizal", referência a "xiri", nome pejorativo, no Pará, do órgão sexual feminino.
Na semana retrasada, o local estava vazio. É que foi lá que uma reportagem de um programa de TV flagrou uma mãe que supostamente aceitou vender sua filha de 15 anos por R$ 500.O assunto corria por bares, táxis e repartições públicas. Para a maioria da população, que nada tem a ver com exploração sexual, a cidade foi injustamente tachada de primitiva. "Isso aqui é exceção", disse o prefeito Pedro Barbosa (PMDB).
O que conselhos tutelares, policiais e prefeituras tentam entender é como minorar um problema que, segundo eles próprios, tem raízes culturais."A avó fez isso, a mãe fez isso", disse o delegado Adalberto Cardoso, de Portel. Para a conselheira tutelar da cidade, Catherine Sousa, esse elemento se manifesta na banalidade com que as pessoas tratam o problema. "É um tabu, todo mundo sabe, mas ninguém age."Outra questão é a localização remota. De Belém até Portel, pode-se gastar até 25 horas de barco, como ocorreu aos policiais civis que foram até lá promover uma operação intitulada Cadê seu Filho?, para retirar crianças de situações de risco.Nas comunidades ainda mais afastadas o maior problema não é a prostituição, mas o abuso sexual de crianças, na maior parte das vezes por um familiar. Em Portel, um terço dos 18 presos está lá por esse crime.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Da série primaveril...

Liberdade é quando a gente pode ir a qualquer lugar sem medo. Sem medo de extrapolar, sem receio de ser menos. É quando a gente pode simplesmente ser, assim esparramando, e preencher todas as áreas de si. Revisito cômodos que me prenderam por um tempo e esparramo neles o meu jeito novo-velho de ser. Sou neles. Eles que me impediram de ser por tanto tempo. Eles que me prenderam, mas me forçaram a explorar outros cômodos que eu desconhecia, que estavam lacrados. Tive de construir alguns novos espaços pq os antigos estavam tomados pelo medo. Retiro a poeira, leio anotações, sorrio de mim, celebro minhas lágrimas. E mantenho um coração agradecido pq quando, como diz um amigo, cortejei a insanidade, a venci. Não, não a venci. Entramos em um acordo justo. Ela deve voltar em outro momento oportuno. Me deu uma trégua, deve ter achado que eu merecia. Entrei em mais um lugar que estava fechado hj. Olhei lá dentro. Ri e debochei: “como pude ter tanto medo de vc?”. A gente cresce, se reinventa e se admira. Se não fosse assim, teria apenas os mesmos cômodos rotineiros de sempre. E eles parecem tão limitados agora...
Achei isso numa “gaveta”:

Santa Chuva
Maria Rita
Composição: Marcelo Camelo

(ele)
Vai chover de novo
Deu na TV
Que o povo já se cansou
De tanto o céu desabar
E pede a um santo daqui
Que reza a ajuda de Deus
Mas nada pode fazer
Se a chuva quer é trazer você pra mim
Vem cá, que tá me dando uma vontade de chorar
Não faz assim
Não vá pra lá
Meu coração vai se entregar
À tempestade...

(ela)
Quem é você pra me chamar aqui
Se nada aconteceu?
Me diz?
Foi só amor?
Ou medo de ficar
Sozinho outra vez?
Cadê aquela outra mulher?
Você me parecia tão bem...
A chuva já passou por aqui
Eu mesma que cuidei de secar
Quem foi que te ensinou a rezar?
Que santo vai brigar por você?
Que povo aprova o que você fez?
Devolve aquela minha TV
Que eu vou de vez
Não há porque chorar
Por um amor que já morreu
Deixa pra lá
Eu vou, adeus
Meu coração já se cansou de falsidade...

quinta-feira, 18 de junho de 2009

São Félix

Recebi essa notícia por email, vinda da Prelazia de São Félix do Araguaia, terra de dom Pedro Casaldáliga. Como o sangue já correu muito por aquele chão, quero deixar aqui, de alguma forma, meu apoio aos santos construídos, pedra por pedra, naquele lugar.

Dois sem terra assassinados na Bordolândia

Segundo informações recebidas do Padre Paulo César, da CPT da Prelazia de São Félix do Araguaia, dois sem terra foram mortos a tiros, na manhã de hoje, 17/06, por caminhoneiros inconformados com o bloqueio da BR 158. Desde a semana passada constantes bloqueios da rodovia aconteceram, para chamar a atenção das autoridades para a realidade das famílias dos sem terra. O último bloqueio já durava 48 horas. Os trabalhadores mortos foram: Abiner José da Costa, de 49 anos, e pai de 5 filhos e Edeoton Rodrigues do Nascimento, 48 anos e pai de 5 filhos.

Os manifestantes são trabalhadores que foram despejados da Fazenda Bordolândia, por decisão da Justiça Federal de Mato Grosso, no final de março deste ano em razão de Ação Cautelar proposta pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público Estadual, que alegaram danos causados ao meio ambiente. O Juízo da Primeira Vara Federal da Seção Judiciária de Mato Grosso determinou a retirada de todos os ocupantes da fazenda (clientes e não clientes da reforma agrária), inclusive das famílias cadastradas pelo INCRA, que tinham iniciado os procedimentos para a regularização de seus assentamentos, já haviam plantado roças e aguardavam suas colheitas. Os únicos a permanecerem na fazenda foram os proprietários.

Desde o início do cadastramento das famílias a serem assentadas na Bordolândia foram feitas denúncias da presença de grupos cujos integrantes não correspondiam ao perfil de clientes da reforma agrária; era visível que pretendiam aproveitar-se apenas da madeira ali existente e para tanto destruíam o meio ambiente; várias foram as denúncias, principalmente ao Ministério Público Federal no Estado do Mato Grosso. Pretendia-se que houvesse uma investigação local para encontrar os responsáveis e puni-los.

Numa das vezes em que esteve na presidência do INCRA, o Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, Dom Leonardo Ulrich Steiner, alertou, verbalmente, que a seleção das famílias a serem assentadas deveria ser acompanhada por agentes da polícia federal para impedir que grupos estranhos, com outros interesses, impedissem o bom andamento do procedimento. É lamentável que o Ministério Público ao pretender a retirada de todos (cadastrados e não cadastrados; clientes e não clientes da reforma agrária), como forma de defender o meio ambiente, não tenha também considerado os princípios constitucionais da defesa dos direitos da pessoa humana.

As famílias despejadas acamparam às margens das estradas da região, em péssimas condições e esperavam uma rápida solução para este impasse. A fazenda Bordolândia, uma área de 55 mil hectares, da Agropecuária Santa Rosa também questionou na justiça os laudos que atestavam improdutividade da área. As primeiras notícias veiculadas pelo Circuito Mato Grosso e o Globo on-line diziam que caminhoneiros em confronto com os manifestantes sofreram ferimentos leves, mas nem sequer mencionaram a morte dos sem terra.

Mais informações:
Assessoria de Comunicação
Comissão Pastoral da Terra
Secretaria Nacional - Goiânia, Goiás.
Fone: 62 4008-6406/6412/6400
http://www.cptnacional.org.br/

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Voluntariamente

Pouco a pouco, as engrenagens me calam. Silenciam o que demorou tanto tempo para ganhar voz. E eu vejo. Me entristeço. Mas deixo. Não há espaço para resistência entre os envelopes das contas que se acumulam sobre a mesa da cozinha.
Não me sai da cabeça esse grito de Maiakovski:


"Na primeira noite, eles aproximam-se
e colhem uma flor do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem
pisam flores, matam o nosso cão
E não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa
rouba-nos a lua
e, conhecendo o nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada
já não podemos dizer nada."

terça-feira, 9 de junho de 2009

Investimento

Sou feito barro. Maleável, às vezes. Dura e quebradiça, de vez em quando. Tudo depende do investimento de água que se faz em mim, da paciência em me moldar e da qualidade das ligas à qual sou submetida. Pode-se perder um trabalho de uma vida em minutos de vacilo ou alcançar a forma almejada com a medida certa. Sou assim, feita de barro.

domingo, 7 de junho de 2009

Da encarnação do amor

Já sonhei com amores impossíveis. Também com os arrebatadores ou com os encantados. Já pensei em fazer o amor me seguir. Assim como já o persegui até aparentemente vencê-lo pelo cansaço. Ele também já quis me vencer pelo cansaço. Perdemos os dois. Eu o quis desfilando pelas naves centrais. Eu o quis dando frutos incontáveis. Não o quis. Evitei. Persegui. Perdi e me perdi.
Topei com ele em duas versões nesse fim de semana. Numa delas ele cantou, fez bonito, deixou claro a que veio. Mostrou e mostrou-se. Que amava e era amado. Arrebatou, emocionou, dançou.
Na outra, ele pareceu tímido. Estava em um canto. Longe do centro das atenções. Pulava e sorria descompromissado. Com uma certeza inconsequente de que cuidavam dele. Desdenhou do motivo pelo qual as pessoas estavam ali. Fez-se ele mesmo o centro para quem a ele realmente importava. Sem se preocupar se outros o olhavam. Importava apenas um olhar e ele o teve.
Depois, na pista, enquanto o primeiro amor atraía para si todos os olhares admirados e os tornava felizes, o segundo puxava pelas mãos a devoção de quem mudou a vida para acomodá-lo, para torná-lo viável. Ele não tinha um milímetro de culpa ou compromisso com isso. Mas rodopiava nos braços de quem o amava. E sorria, ele mesmo, feliz.
Esse segundo amor derrubou o que eu ainda tinha de conceito enlatado. Ele nem sabe disso. Nunca vai saber. Mas foi tão amor que mudou quem inadvertidamente se deixou ser tocado por ele. Eu fui.